8.4.09

O GRAMADO

Uma desavença entre um morador e a direção do condomínio onde moro mostrou-me um traço interessante da natureza.

Não sei muito bem da história. A maior parte dela é especulação de minha parte, mas o resultado é o que conta, pois ele independe dos meandros do relacionamento humano e sim do ato final.

Este condomínio tem uma particularidade, que é a substituição de calçadas por gramados em frente das casas. Ao que tudo indica, o morador achou de ocupar o recuo destinado à sua. Talvez por achar que fosse uma área pública e o gramado muito grande para a manutenção às suas expensas. A verdade é que o morador lascou um muro no que seria considerado excesso, deixando para o lado de fora apenas aqueles, sei lá, três ou quatro metros de recuo legais da Prefeitura.

Pelo que pude perceber, o condomínio reagiu, obrigando o homem a interromper a construção de sua muralha. E durante muito tempo tivemos que conviver com aquele muro enorme e inacabado, parte no reboco, parte no tijolo. Uma coisa muito “feia” de se ver, principalmente em se tratando de um condomínio “chique” (pode acreditar, apesar de duro, eu moro num condomínio chique). Era mais ou menos como mudança de pobre. Sabe aquela Kombi, cheia até as alturas, com cadeiras misturadas ao colchão, a hélice do ventilador rodando como um cata-vento? A visão do muro do distinto condômino era mais ou menos essa.

Disputa vai, disputa vem, e a frente da casa do sujeito ficou abandonada. O mato começou a tomar conta da área, não deixando chance ao gramado que, maltratado, sucumbiu.

Um belo dia, finalmente, ao que me parece, o litígio deu mais um passo, e o que havia sido construído do muro, foi derrubado. Nesse momento entram outros personagens para essa história urbana.

O matagal, apesar de insultar os olhos impolutos dos outros moradores, estava viçoso. O morador deixou limpa, apenas a trilha de passagem de seu carro, o resto virou uma enorme “plantação” de capim, alpiste, maria-sem-vergonha, mato enfim. Até um pé de boldo atreveu-se a crescer por ali.

Agora, aquelas terras passaram a ser freqüentadas por bandos de biquinhos-de-lacre, cambaxirras, caga-sebos. Até um joão-de-barro montou casa no poste próximo e decidiu constituir família no bairro.

Durante mais de um ano, aquela situação perpetuou-se e todos os dias, ao voltar para casa, eu admirava a revoada dos passarinhos. Existe mais delicadeza do que um bando de biquinhos-de-lacre sobrevoando os pés de alpiste, em busca de alimento? Eles estavam ali, todos os dias, ao alcance dos olhos e ouvidos de quem quisesse vê-los ou ouvi-los.

Pois é... pena que, enquanto isso, o relógio do homem estava funcionando e um dia, inexoravelmente, morador e condomínio teriam que chagar a um termo. E parece que chegaram.

Esta semana o mato foi cortado, o capim, o alpiste e tudo o mais foram transformados em fogueira e cinzas. Os bandos de biquinhos, cambaxirras e outros passarinhos, foram expulsos dali. O sabiá está preocupado quanto ao futuro de sua família, na vizinhança.

Finalmente as placas de grama foram colocadas, dando um toque de “paisagismo e organização”.

O gramado estéril está lá, aguardando uma manada de gnus (Connochaetes gnou), que nunca virá...

Será? Se depender daqueles que trouxeram a praga dos caramujos africanos para cá.... Sei não.

Só sei que infelizmente ninguém mais precisa preocupar-se com a infestação de biquinhos-de-lacre, cambaxirras, tico-ticos ...

O canarinho está preocupado!

Eu também!

Marcos Santos
151107

Rio de Janeiro

3 comentários:

jugioli disse...

Preocupante este mundo!!!!
Tristeza.

@dis-cursos

Unknown disse...

Tadinho...boa páscoa!!!

Paula disse...

Que peninha!
Um abraço.

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